sábado, 18 de abril de 2009

O caminho da sensatez

Só a volta aos fundamentos da fé cristã será capaz de nos oferecer o caminho da sensatez e da liberdade
Como pastor, tenho observado que muitos cristãos vivem aprisionados e não gozam a liberdade em Cristo. São pessoas movidas por ansiedades, medos e inseguranças. Muitos carregam mágoas, culpas e ressentimentos. Por isso, não conseguem se relacionar livremente, nem com Deus, nem com o próximo. Jovens e adolescentes que são prisioneiros da aparência ou dominados pelas vontades e caprichos dos outros. Movem-se por impulsos sexuais e afetivos levianos e descomprometidos, ou são dependentes de drogas e bebidas.

Somos prisioneiros do passado por causa das nossas lembranças e memórias. E somos prisioneiros do futuro por causa das ansiedades. Em virtude disso, o presente torna-se vazio e cheio de tédio. A falta de significado intensifica a ansiedade e aumenta a vulnerabilidade a toda forma de manipulação emocional e religiosa, o que limita ainda mais a liberdade.

O apóstolo Paulo, grande mestre do ensino sobre a graça de Deus e da liberdade cristã, apresenta na sua carta aos gálatas, capítulo 3:1-5, cinco perguntas que descrevem seu coração perturbado diante do caminho absurdo que o povo de Deus havia tomado. Para ele, a ignorância daquilo que Cristo fez e a insensatez estavam levando muitos a viverem na mentira e na ilusão, ao invés de gozarem da vida abundante e liberta que Cristo lhes havia conquistado. As cinco perguntas de Paulo são um apelo à razão, ao bom senso e à lucidez para que, ao refletirem sobre elas, tais pessoas pudessem retornar ao caminho da liberdade.

A primeira pergunta nos coloca em contato com o evento mais importante da história da fé: “Ó gálatas insensatos! Quem os enfeitiçou? Não foi diante dos seus olhos que Jesus Cristo foi exposto como crucificado?” A cruz e a ressurreição são os eventos que garantem nossa liberdade. É o fato central em torno do qual todos os outros estão subordinados. A revelação do amor de Deus em Cristo Jesus, a forma como o pecado e a culpa foram resolvidos, a dádiva do “Espírito de adoção” que nos liberta do espírito da escravidão, tudo isto é central e fundamental para nos assegurar uma vida plena e verdadeira.

A segunda pergunta aponta para a natureza da vida cristã: “Gostaria de saber apenas uma coisa: foi pela prática da lei que vocês receberam o Espírito, ou pela fé naquilo que ouviram?” O Espírito Santo é a presença de Deus em nós e entre nós, e também o que torna a vida cristã possível. Cristo não foi apenas um grande exemplo de vida que deve ser imitado; ele vive em nós pelo poder do Espírito Santo, numa união real que nos possibilita viver pelo poder da ressurreição. Cristãos sensatos permanecem atentos ao que Deus está fazendo em suas vidas e nas experiências que o Espírito proporciona. Por outro lado, crentes insensatos ignoram tudo isso, criam regras para a presença do Espírito Santo, insistem em que o cumprimento de tais normas é imprescindível para termos o Espírito de Deus. Acabam vivendo por espasmos espirituais ou ancorados na espiritualidade dos outros.

A terceira questão que Paulo levanta nos conduz ao caminho da maturidade. “Será que vocês são tão insensatos que, tendo começado pelo Espírito, querem agora se aperfeiçoar pelo esforço próprio?” O apóstolo nos apresenta um caminho que se inicia com a revelação de Cristo e que continua com a presença e o poder do Espírito Santo que derrama sobre nós o amor de Deus, possibilitando-nos a viver a vida cristã. Quanto entramos neste caminho, iniciamos o processo de libertação. O problema é que começamos bem, crendo no amor de Deus e em sua graça maravilhosa; mas depois continuamos usando recursos próprios do legalismo ou moralismo, da manipulação religiosa e da chantagem. Iniciamos com o amor e continuamos com o cinismo e a desconfiança. Paulo está dizendo: “Usem a cabeça!” O bom senso nos preserva de abandonar o Evangelho da graça.

A quarta pergunta conduz ao reconhecimento dos valores que nos asseguram a liberdade: “Será que foi inútil sofrerem tantas coisas?” O que Paulo está dizendo é queuma pessoa sensata tem valores e por isso sofre – mas isto não inibe, nem limita a liberdade, muito pelo contrário. Uma pessoa sensata sabe o que quer e o que é importante para ela, e assim persevera no caminho da liberdade. Por outro lado, aqueles que não têm valores acabam vivendo por impulsos, tornam-se prisioneiros das pressões dos outros. Como cristãos aprendemos que o amor, a paz, o domínio próprio, a misericórdia e a mansidão são valores fundamentais. Aprendemos que o corpo é o templo do Espírito Santo e que nossa mente não é nenhum depósito de lixo. Sabemos que o perdão é melhor que a vingança, e a justiça é o caminho para a santidade. Quando perdemos tais valores, ficamos reféns da propaganda e da ilusão. Perdemos a liberdade.

Por fim, a última pergunta reafirma tudo o que ele tem dito. “Aquele que lhes dá o seu Espírito e opera milagres entre vocês realiza estas coisas pela prática da lei ou pela fé com a qual receberam a palavra?” Quanto mais fiéis formos para com o Evangelho que recebemos, mais livres e verdadeiros seremos. O Evangelho nos revela a obra extraordinária da redenção de Jesus Cristo, nos coloca em comunhão com Deus e nos oferece seu Espírito que realiza os milagres da vida em nós. Esta é a realidade que nos envolve. Trocar esta realidade por outra é viver na insensatez.

O apelo de Paulo é simples e o que ele propõe é óbvio: Usem a cabeça! Pensem! Não sejam estúpidos! Vivam sensatamente! A ausência de liberdade para muitos cristãos hoje é fruto da ignorância para com as verdades redentoras e libertadoras em Cristo, da substituição da Palavra revelada por palavras vazias e sem propostas transformadoras. São milhares de irmãos e irmãs que perderam o juízo e se aventuraram por um caminho de manipulação, chantagem e ignorância espiritual e teológica. Desenvolveram uma espiritualidade tão adoecida quanto a teologia que abraçaram ou que lhes foi ensinada. Só que Paulo nos recomenda a volta para os fundamentos da fé cristã, pois são eles que nos oferecerão o caminho da sensatez e da liberdade.

Ricardo Barbosa de Souzaé conferencista e pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasilia

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